Fonte: TRF/1.ª Região - 29/11/2013 - Adaptado pelo Guia Trabalhista
O MPF apresentou a denúncia por estelionato ao identificar que o
acusado, proprietário de imobiliária, foi procurado por outros
denunciados para providenciar os saques junto à Caixa Econômica Federal
(CEF). Embora soubesse que os interessados não preenchiam os requisitos
legais para movimentação das contas, o réu procurou um banco e
providenciou financiamento parcial de um apartamento em Goiânia/GO, já
que, segundo a legislação vigente, a aquisição de moradia própria
autorizava a movimentação dos valores de FGTS.
Assim que os recursos eram liberados, os denunciados providenciavam a venda do imóvel com a sub-rogação da dívida, e, assim, o apartamento foi objeto de diversos financiamentos em curto espaço de tempo.
O denunciado, no entanto, se defende e alega que o modus operandi para o saque do FGTS foi legítimo, sem qualquer irregularidade, fraude ou falsificação na documentação. Afirma, ainda, que agiu no exercício regular direito, pois é despachante imobiliário, devidamente contratado pelos demais denunciados para, em seus nomes, comprar imóveis utilizando os recursos do FGTS.
No entanto, o relator do processo na Turma, juiz federal convocado Alexandre Buck, discorda do réu e afirma que, na qualidade de proprietário de imobiliária, tinha o acusado total conhecimento das regras para o levantamento do Fundo e, mesmo sabendo que os demais não preenchiam os requisitos legais, providenciou, mediante pagamento, o saque. “Não procede a alegação de regularidade da documentação utilizada para a liberação dos valores do FGTS bem como não há como prosperar a alegada atipicidade da conduta, uma vez que tem-se caracterizado o crime de estelionato”, afirmou o julgador.
O magistrado destacou que houve a simulação de contrato de compra e
venda com a finalidade exclusiva de movimentar valores do FGTS,
induzindo a CEF em erro, o que se enquadra perfeitamente no tipo
previsto no art. 171 do Código Penal. Explicou, ainda, que a mesma norma
define a continuidade delitiva, que ocorre quando o agente, mediante
mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma
espécie, e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e
outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação
do primeiro.
“É exatamente o caso dos autos. O prazo inferior a 30 dias entre um delito e outro é apenas uma baliza, ou seja, não existe uma determinação expressa para isso e, portanto, não pode ser aplicado de maneira rígida, cabendo certo a aplicação do art. 71 do CP em detrimento do concurso material, como definiu o juízo de primeiro grau”, esclareceu o relator.
Assim, Alexandre Buck deu parcial provimento à apelação, mantendo a condenação por estelionato, mas reduzindo a pena para três anos, um mês e dez dias de reclusão e 62 dias-multa e deferindo a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos. (Processo n.º 0001137-57.2002.4.01.3500).